LEITURAS - 108
[retrato]
Pulou do quente ainda com estrelas e quase nem molhou a ponta do nariz, engoliu uma água de unto e tragou um dedal de aguardente, descompôs a mulher, à pressa, por lhe questionar e chorar a côdea do cão, e, mal que apresilhado o cinto e embandoleirada a escopeta, ala, que se faz tarde, baforando fumaças e respiração pelo nevoeiro, como se fosse a arder.Cara de múmia, enxuta, de peliças enfoladas para o vazio de dentes, ainda por cima pelo tabaco de cinquenta anos, logo apagado se o não puxasse, Manuel Félix todo ele era seco: mãos de santo de aldeia, só tendões e osso, tostadas, quadris por onde o cós das calças fugia, esbarrigando a camisa de tormentos, canelas a que umas polainas ressecas e sem boleio davam o ar das pernas de pau levadas a Santo Amaro, de promessa, por coxos sarados. Como se afiada em rebolo, dir-se-ia quebra-vento apropositado a cana do nariz, e não seriam as costeletas, de ralas, tojo molarinho, que o tolheriam de papar léguas em cima de léguas, tanto como nem os setenta anos, cumpridos em Janeiro, mês dos gatos, que têm sete fôlegos.
(Verbo, 1984)
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Etiquetas: leituras
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