30/11/07

A MORTE É A CURVA DA ESTRADA


grafitto - foto de ana assunção

Porque há exactamente 72 anos ele deixou de ser visto...

A morte é a curva da estrada

A morte é a curva da estrada,
Morrer é só não ser visto.
[...]

Iniciação

Não dormes sob os ciprestes,
Pois não há sono no mundo.
........................................
O corpo é a sombra das vestes
Que encobrem teu ser profundo.
Vem a noite, que é a morte,
E a sombra acabou sem ser.
Vais na noite só recorte,
Igual a ti sem querer.

Mas na Estalagem do Assombro
tiram-te os Anjos a capa.
Segues sem capa no ombro,
Com o pouco que te tapa.

Então Arcanjos da Estrada
Despem-te e deixam-te nú.
Não tens vestes, não tens nada:
Tens só teu corpo, que és tu.

Por fim, na funda caverna,
Os Deuses despem-te mais.
Teu corpo cessa, alma externa,
Mas vês que são teus iguais.
(...)
A sombra das tuas vestes
Ficou entre nós na Sorte.
Não 'stás morto, entre ciprestes.

.............................................
Neófito, não há morte.

Fernando Pessoa

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