25/01/07

CAMONIANAS- 26

a propósito da lírica camoniana e dos problemas de fixação do «corpus»

não sei se o camões hoje teria escrito as suas rhythmas,
começa porque não saberia ao certo quais eram e então não havia camonistas
para discutirem a questão, e depois talvez não valesse a pena
falar àquela gente, e os auditórios têm limites de paciência.

Por exemplo, o dia em que eu nasci moura e pereça,
diz-me o aguiar e silva, não é dele quase de certeza.
E eu respondo: é tão bom que tem mesmo de ser dele,
e o vítor ri, exclamando: você já está como o faria e sousa.

A ironia desta conversa é que ela se passava
no instituto camões, calcule-se, somos ambos do conselho geral,
tratando da expansão da língua portuguesa
que se mais mundo houvera lá chegara

e estava uma tarde esplêndida de janeiro
e se o camões estivesse ali não havia de acreditar
que um de nós estivesse prestes a tirar-lhe um soneto
o mais doutamente possível e o outro lho quisesse devolver,

invocando-lhe o som, a fúria e o sentido,
nem que há séculos que as coisas se vão passando assim,
e uns gajos de nome germânico, lachmann, storck,

e mais alguns. A moral da história é que um verso de camões
com pouca variação é sempre um verso de camões,
é a coisa mais bela e mais difícil do mundo
e dá cá uma guinada tão especial que só pode ser dele.

Vasco da Graça Moura

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