03/01/07

LEITURAS - 31



As maçãs

Nicholson levantou os olhos para ele e deteve-o.
"O que faria você se pudesse modificar o sistema de ensino?", perguntou com um ar ambíguo. "Alguma vez pensou no assunto, por acaso? Responda só a esta pergunta", pediu Nicholson. "O ensino é a minha mania pessoal... é isso que ensino e é por isso que pergunto."
"Bem... Não tenho bem a certeza do que é que fazia", disse Teddy. "Sei é que com certeza não começava pelas coisas que normalmente se dão primeiro." Cruzou os braços e pensou um momento. "Acho que primeiro reunia as crianças todas e lhes mostrava como se medita. Tentava mostrar-lhes o que se deve fazer para perceber quem somos, não só os nomes e essas coisas..., acho eu, mas, mesmo antes disso, levava-os a esvaziar a cabeça de tudo que os pais e todas as outras pessoas lhes tivessem dito. Quer dizer, mesmo que os pais só lhes tivessem dito que um elefante é grande, eu obrigá-los-ia a tirar isso da cabeça. Um elefante só é grande quando está ao pé de outra coisa qualquer — um cão ou uma mulher, por exemplo." Teddy tornou a pensar um momento. "Nem mesmo lhes dizia que os elefantes têm tromba. Pode ser que lhes mostrasse um elefante, se tivesse um à mão, mas deixava-os aproximar-se do elefante sem saber mais sobre o elefante do que o elefante sabe sobre eles. Fazia o mesmo com a erva e as outras coisas. Nem sequer lhes dizia que a erva é verde. Cores são só nomes. Quer dizer, se você lhes diz que a erva é verde, isso faz com que comecem à espera que a Nicholson levantou os olhos para ele e deteve-o. "O que faria você se pudesse modificar o sistema de ensino?", perguntou com um ar ambíguo. "Alguma vez pensou no assunto, por acaso? Responda só a esta pergunta", pediu Nicholson. "O ensino é a minha mania pessoal... é isso que ensino e é por isso que pergunto."
"Bem... Não tenho bem a certeza do que é que fazia", disse Teddy. "Sei é que com certeza não começava pelas coisas que normalmente se dão primeiro." Cruzou os braços e pensou um momento. "Acho que primeiro reunia as crianças todas e lhes mostrava como se medita. Tentava mostrar-lhes o que se deve fazer para perceber quem somos, não só os nomes e essas coisas..., acho eu, mas, mesmo antes disso, levava-os a esvaziar a cabeça de tudo que os pais e todas as outras pessoas lhes tivessem dito. Quer dizer, mesmo que os pais só lhes tivessem dito que um elefante é grande, eu obrigá-los-ia a tirar isso da cabeça. Um elefante só é grande quando está ao pé de outra coisa qualquer — um cão ou uma mulher, por exemplo." Teddy tornou a pensar um momento. "Nem mesmo lhes dizia que os elefantes têm tromba. Pode ser que lhes mostrasse um elefante, se tivesse um à mão, mas deixava-os aproximar-se do elefante sem saber mais sobre o elefante do que o elefante sabe sobre eles. Fazia o mesmo com a erva e as outras coisas. Nem sequer lhes dizia que a erva é verde. Cores são só nomes. Quer dizer, se você lhes diz que a erva é verde, isso faz com que comecem à espera que a erva tenha um determinado aspecto—o aspecto que você quer que ela tenha — em vez dum outro qualquer que pode ser igualmente bom ou muito melhor... não sei. Obrigava-os a deitar cá para fora toda a data de maçã que os pais deles e toda a gente os tinham obrigado a engolir."
"Não corria o risco de criar uma pequena geração de ignorantes?"
"Porquê? Não seriam mais ignorantes do que um elefante ou um pássaro ou uma árvore", asseverou Teddy. "Só porque uma pessoa é duma certa maneira, em vez de se comportar de uma certa maneira, não quer dizer que seja ignorante."
"Não?"
"Não", disse Teddy. "Além disso, se eles quisessem aprender todas essas outras coisas — nomes, cores, etc. — podiam fazê-lo, se lhes apetecesse, mas mais tarde, quando fossem mais velhos. Mas gostava que começassem por aprender a maneira verdadeira de olhar para as coisas - e não apenas a maneira como os outros apreciadores de maçã as olham — isso é que me interessa." Aproximou-se mais de Nicholson e estendeu-lhe a mão. "Tenho de ir. A sério. Gostei muito..."

Salinger in Nove Contos – Teddy
tradução de Vasco Pulido Valente

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