20/09/06

DO FALAR POESIA - 55



Crónica das águas novas

«Os ouriços estão mesmo, mesmo a abrir, amarelinhos e cerdosos como os seus irmãos cacheiros. Até à castanha a chuva ainda veio fazer bem!
Ouço cantar:

No alto daquela serra (oh meu bem!)
Tem meu pai um castanheiro,
Que dá castanhas em Maio (oh meu bem!)
Cravos roxos em Janeiro!

A poesia é isso: fazer com que os castanheiros dêem castanhas agora e cravos mais logo, sem transtorno do Mundo nem míngua do assador. E que chova! Chova do céu a água precisa, entre na terra a que baste, e empoce a restante até à evaporação. Com poças estreladas se fazem nuvens novas. Com nuvens novas se enchem as poças velhas, e assim por diante. Eterno retorno.»
Vitorino Nemésio, Viagens ao pé da porta (1949)

Etiquetas:

Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com Licença Creative Commons