17/12/05

OMNIA VINCIT AMOR - 38


imagem de eli

"... Ainda te lembrarás de mim? Deve ser horrível, para ti, que vives num mundo agradável, estar casada com uma sombra ... Tenho a impressão que as minhas cartas devem parecer vir de um universo irreal e gasoso, como as mensagens espíritas dos mortos. Não devo ter espessura, consistência humana, penso eu ... eu amo-a. Se eu não a conhecesse, persegui-la-ia pelas ruas com propostas sórdidas e veementes. Recordo-me do primeiro dia em que a vi, do seu perfil de Boticelli, recordo-me do ano seguinte na praia, do seu cabelo preso atrás e da sua risca ao meio, do seu aspecto de retrato de Ingres, recordo-me do seu cabelo cortado e do seu ar de midinette, e amo perdidamente todas as suas encarnações, sem poder escolher entre elas ... Mas eu, que sou excessivo, berro-te como um possesso, como um doido, como um personagem de Dostoievski, que gosto tudo de ti ... Amo-te para além da minha bruteza e da minha falta de ternura, desesperadamente ..."
António Lobo Antunes, "D'este viver aqui neste papel descripto. Cartas da guerra",

excerto encontrado in http://cadecasa.blogspot.com/

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